Hoje em dia, o celular é praticamente uma extensão de nós mesmos, não é? Quem não tem um aparelho conectado o tempo todo, seja para trabalho ou lazer? Mas, e se o seu chefe começar a pedir para que você use o seu celular pessoal para atividades profissionais? Isso é legal? Você é obrigado a fazer isso? Neste post, vamos esclarecer esses questionamentos à luz das leis trabalhistas brasileiras, com base em conceitos teóricos e científicos sobre o tema.
O Uso do Celular Pessoal no Trabalho: Uma Situação Comum?
A pandemia de COVID-19 acelerou a adoção de tecnologias no ambiente de trabalho, especialmente no que se refere ao uso de dispositivos pessoais para a execução de tarefas profissionais. Com o aumento do home office, muitas empresas passaram a solicitar que seus colaboradores utilizassem seus próprios celulares para facilitar a comunicação e o cumprimento de tarefas. Mas será que isso é correto sob a ótica das leis trabalhistas?
O Que Diz a Lei?
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não menciona explicitamente a questão do uso de celulares pessoais. Porém, existem alguns pontos que podem nos ajudar a entender se a prática é adequada ou não. A CLT é um conjunto de normas que regulamenta as relações de trabalho no Brasil, e, por mais que o texto da lei não contemple especificamente o uso de aparelhos pessoais, o art. 2º e o art. 9º podem ser analisados.
- Arte. 2º da CLT: O empregador é responsável por fornecer os meios necessários para que o trabalho seja realizado. Ou seja, a empresa deve fornecer as ajudas adequadas para o desempenho das funções do funcionário, o que pode incluir celulares, computadores e outros equipamentos. Não é adequado transferir esse custo para o trabalhador, principalmente se isso gerar um desgaste ou custo adicional para ele.
- Arte. 9º da CLT: Este artigo estabelece que o empregador não pode impor condições que resultem em prejuízos ou prejuízos para o trabalhador. Ou seja, se o uso do celular pessoal implica custos extras para o colaborador (como aumentar a conta de telefonia ou gerar desgaste adicional), a empresa pode ser responsabilizada por essa imposição.
Além disso, existe uma Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) , que exige que os dados do trabalhador sejam protegidos, inclusive em situações de uso de dispositivos pessoais para atividades profissionais. Se uma empresa pede para você usar seu celular, ela também precisa garantir que seus dados pessoais e corporativos sejam tratados com segurança, o que implica na necessidade de um acordo claro entre as partes.
A Oposição de Interesse: O que Fica para o Trabalhador?
Imagine que você tenha que usar seu celular para trabalhar e começar a perceber que o contato telefônico está subindo ou que seu aparelho está ficando sobrecarregado. Esse é um custo que não deve ser repassado ao trabalhador. A ( decisões dos tribunais) tem mostrado que o empregador tem o dever de arcar com os custos que envolvem o uso de dispositivos pessoais para o trabalho.
Por exemplo, se você for obrigado a usar o celular para responder e-mails, fazer chamadas ou acessar sistemas corporativos, a empresa pode ser obrigada a fornecer um reembolso ou até mesmo um celular corporativo, para que o funcionário não arcar com custos que são de responsabilidade do empregador.
O Que Diz a Prática: Uma Realidade Difícil de Ignorar
Na prática, muitas empresas utilizam o pessoal celular de seus colaboradores, especialmente em funções que desativam a comunicação constante, como em áreas de vendas, atendimento ao cliente ou gerenciamento. Embora essa prática não seja necessariamente ilegal, ela levanta questões sobre a equidade e o bem-estar dos trabalhadores.
Em um estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) , foi constatado que o uso de dispositivos pessoais no trabalho aumenta o risco de burnout (síndrome de esgotamento profissional), uma vez que os limites entre a vida pessoal e profissional ficam borrados. Quando o trabalhador é obrigado a usar o celular para tarefas de trabalho, ele acaba se tornando mais acessível o tempo todo, o que pode prejudicar sua qualidade de vida.
O que fazer se você se sentir prejudicado?
Se você está se sentindo sobrecarregado com o uso de seu celular pessoal para o trabalho, é importante buscar uma conversa aberta com seu empregador. Você pode sugerir alternativas, como o fornecimento de um celular corporativo ou o reembolso dos custos extras gerados. Caso o problema persista e você se sinta prejudicado, pode ser útil procurar orientação jurídica, uma vez que a imposição de tais condições pode ser considerada abusiva, dependendo da situação.
Sugestão de cláusula do contrato de trabalho:
Uma cláusula que pode ser incluída em um contrato de trabalho , seja ele verbal ou escrito , para regular o uso do pessoal do funcionário no desempenho de suas funções. O objetivo é garantir que as responsabilidades de ambas as partes sejam claras e evitem qualquer mal-entendido futuro.
Exemplo de Cláusula sobre o Uso de Celular Pessoal no Contrato de Trabalho
Cláusula X – Uso de Equipamentos Pessoais para Atividades Profissionais
- Obrigação de Fornecimento de Ferramentas de Trabalho : O Empregador se compromete a fornecer todos os recursos e ferramentas necessárias para o bom desempenho das funções do Empregado, incluindo, quando aplicável, aparelhos eletrônicos como celular corporativo, computadores e outros dispositivos.
Explicação sobre os Itens da Cláusula:
Obrigação de Fornecimento de Ferramentas : Aqui, a cláusula começa deixando claro que o empregador tem a obrigação de fornecer as ferramentas de trabalho adequadas. Isso é importante porque, como vimos, a CLT estabelece que é responsabilidade da empresa fornecer os meios necessários para o desempenho das funções.
- Uso do Celular Pessoal : O Empregado poderá ser solicitado a usar seu celular pessoal para o desempenho de atividades relacionadas ao trabalho, exclusivamente para fins de [especificar as atividades, como: comunicação com clientes, envio de relatórios, acesso a sistemas corporativos, etc. ]. Caso o uso do celular seja necessário para a execução de atividades profissionais, o Empregador se compromete a [especificar a compensação, como: reembolsar possíveis custos adicionais, fornecer subsídios para o pagamento de tarifas de telefonia ou outras despesas relacionadas, ou fornecer um complemento corporativo].
Explicação sobre os Itens da Cláusula:
Uso do Celular Pessoal : Essa parte define quando o celular pessoal pode ser utilizado, e para quais atividades específicas. A ideia é evitar que o uso do celular pessoal seja uma prática rotineira sem justificativa.
- Compensação de Custos : O Empregador se responsabiliza por reembolsar o Empregado, mediante comprovantes de pagamento, os custos adicionais diretamente relacionados ao uso do celular pessoal para o desempenho de suas funções profissionais, incluindo, mas não se limitando a, aumento na conta de telefonia, custos com pacotes de dados ou chamadas internacionais possíveis para o trabalho.
Explicação sobre os Itens da Cláusula:
Compensação de Custos : Caso o empregador solicite o uso do celular pessoal, é fundamental que haja um compromisso de reembolso ou compensação de eventuais custos extras. Isso garante que o empresário não seja prejudicado financeiramente.
- Proteção de Dados : O Empregador compromete-se a garantir que todas as informações e dados corporativos acessados ou armazenados no celular pessoal do Empregado estejam em conformidade com as normas de proteção de dados condicionais pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), sendo responsável pela segurança e confidencialidade das informações corporativas durante o uso do aparelho pessoal.
Explicação sobre os Itens da Cláusula:
Proteção de Dados : Com a LGPD em vigor, é importante que uma empresa garanta que dados pessoais e corporativos sejam tratados de forma segura, principalmente quando o trabalho envolve o uso de dispositivos pessoais. Isso evita riscos relacionados ao vazamento de informações.
- Limitação do Uso Pessoal : O Empregado concorda em utilizar seu celular pessoal para fins profissionais de acordo com as políticas internacionais da empresa, sem comprometer sua produtividade ou violar as normas de conduta determinadas pelo Empregador. O uso do celular pessoal para atividades pessoais deverá ser restrito a momentos em que não interfira na execução das atividades profissionais.
Explicação sobre os Itens da Cláusula:
Limitação do Uso Pessoal : Aqui está previsto que o uso pessoal do celular deve ser restrito, para não afetar a produtividade do destinatário. Esse item também ajuda a evitar que o uso do celular se torne uma prática abusiva.
- Alternativas ao Uso de Celular Pessoal : O Empregador compromete-se a revisar periodicamente a necessidade do uso de celular pessoal para a execução das funções profissionais, com a possibilidade de fornecer equipamentos corporativos protetores, caso julgue necessário, a fim de garantir que o Empregado não arque com custos adicionais ou com o desgaste do seu aparelho pessoal.
Explicação sobre os Itens da Cláusula:
Alternativas ao Uso de Celular Pessoal : Essa cláusula demonstra a intenção da empresa de garantir que o empregado não precise usar seu celular pessoal de forma contínua e, caso necessário, oferecer um celular corporativo como alternativa.
- Termos de Revisão : O presente acordo poderá ser revisado a qualquer momento, por ambas as partes, de forma a ajustar as condições de uso do celular pessoal conforme mudanças nas necessidades da empresa ou no perfil das funções desempenhadas pelo Empregado.
Explicação sobre os Itens da Cláusula:
Termos de Revisão : Finalmente, uma cláusula prevê a possibilidade de revisão do acordo, o que é importante para adaptar as condições de trabalho às mudanças tecnológicas ou operacionais da empresa.
Esse tipo de cláusula pode ser incluído em contratos de trabalho escritos ou até mesmo em acordos verbais , desde que as partes envolvidas tenham ciência e concordem com os termos. Se for em formato escrito, recomenda-se que o documento seja assinado por ambas as partes para garantir a formalidade e validade do acordo.
Conclusão
Então, você é obrigado a usar seu celular pessoal para o trabalho? A resposta não é simples, mas a tendência é que o empregador tenha, sim, a responsabilidade de fornecer as ferramentas fáceis para a execução do trabalho, o que pode incluir o celular. Além disso, se isso causar custos extras ou sobrecarga para o trabalhador, a empresa deve arcar com essas despesas ou buscar uma solução que não prejudique o empregado.
Por fim, é sempre importante que ambos, empregador e empregado, busquem um acordo justo que respeite as leis e garantam o bem-estar de todos.
Referências:
- Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)
- Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD)
- Estudos da Fundação Getúlio Vargas (FGV)
Alessandro Gonçalves é Advogado, mestre, pós-graduado em Direito Empresarial, especializado em direito do trabalho, e perito ergonomia do trabalho. Ao longo de 20 anos, Alessandro contratou mais de 2 mil empregados e geriu contratos de alta complexidade na área de terceirização de mão de obra para o governo.
Atualmente coordena uma competente equipe de advogados em seu escritório, com foco total em apoiar os trabalhadores e trabalhadoras na busca de seus direitos trabalhistas.
Comprometido com o processo, Gonçalves e sua equipe estão preparados para te ajudar em qualquer fase de sua relação de trabalho mesmo depois que ela já foi extinta.
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